Na nossa postagem semanal sobre O CASO PESCA E SURF, a sequência do trabalho do Ingo. Agora "A Orla Marítima do Rio Grande do Sul" e os impactos causados pela urbanização. Tanto a pesca como o surf são consequências desta urbanização e daí surgiu o conflito que vem causando tragédias e que não podem ser tratadas como mais uma rotina litorânea.
A Orla Marítima do Rio Grande do Sul e os impactos causados pela urbanização. A orla marítima pode ser definida como uma unidade geográfica inserida na Zona Costeira delimitada por uma faixa de interface entre a terra e o mar. Os limites genéricos estabelecidos para orla marítima são os seguintes: Na zona marinha, a isóbata de 10 metros, profundidade na qual a ação das ondas passa a sofrer influência da variabilidade topográfica do fundo marinho, promovendo o transporte de sedimentos; Na faixa terrestre: 50 (cinqüenta) metros nas áreas urbanizadas ou 200 (duzentos) metros em áreas não urbanizadas, demarcados na direção do continente a partir da linha de preamar ou do limite final de ecossistemas, tais como os caracterizados por feições de praias, dunas, áreas de escarpas, falésias, costões rochosos, restingas, manguezais, marismas, lagunas, estuários, canais ou braços de mar, quando existentes, onde estão situados os terrenos de marinha e seus acrescidos. (MMA, 2006).
Figura 2: Delimitação da Orla marítima para o Projeto Orla (MMA, 2006 pag. 28). Uma conseqüência bastante visível dos processos de urbanização é a destruição das construções junto à orla causada pelas marés meteorológicas, fenômeno popularmente conhecido como “ressaca”, onde o nível da maré aumenta em até 1.5m (ALMEIDA et al.,1997). Aqui no estado do Rio Grande do Sul, este fenômeno vem atingindo muitas residências construídas irregularmente junto à orla marítima, após a retirada das dunas frontais, barreira natural de proteção aos avanços do mar. Municípios como Cidreira, Imbé e Capão da Canoa, no litoral norte e Balneário Hermenegildo, no Litoral Sul, onde a ocupação acelerada e a urbanização da orla marítima, feitas sem considerar a dinâmica do ambiente costeiro, apresentam prejuízos materiais vultosos devido à falta de planejamento.
Foto 1: Impacto Frontal de uma maré meteorológica em construção junto à orla marítima na praia de Cidreira. NICOLODI, 1999.
A conurbação entre balneários e municípios é uma realidade que impacta as comunidades dos municípios do litoral norte do estado do Rio Grande do Sul. Dentre estes municípios, alguns são responsáveis por apresentar as maiores taxas de crescimento populacional anual do estado, como balneário Pinhal (7,47%) e Cidreira (6,61%) (IBGE, 2000), ambos apresentando áreas conurbanas no limite territorial norte de Pinhal com o limite sul de Cidreira. Até 1996, Pinhal era um balneário de Cidreira, vindo posteriormente a se emancipar. A ocupação desordenada da Orla Marítima do Rio Grande do Sul gerou um conflito entre as comunidades tradicionais de pescadores que ali vivem, conhecidos como Pescadores Profissionais Artesanais (PPA’s) e praticantes de esportes náuticos. Ambos necessitam utilizar o mesmo espaço, o mar: os pescadores para sobrevivência através da pesca profissional artesanal, e os praticantes de esportes náuticos utilizam-se das ondas do mar como pista para prática do esporte. A arte de pesca praticada basicamente se constitui em estender uma rede fabricada com fios de nylon entrelaçados em forma de retângulo, perpendicularmente à linha de costa, para que os cardumes de peixes sejam capturados. Acontece que os praticantes de esportes náuticos, conhecidos como surfistas, à deriva no mar, não enxergam os materiais de pesca dispostos no oceano, vindo a enrolar-se nas redes e se afogarem. Dados da Federação Gaúcha de Surf (FGS, 2007) apontam que 45 surfistas já morreram no estado do Rio Grande do Sul em acidentes com rede de pesca desde 1980. Várias medidas foram tomadas na tentativa de acabar com esses problemas, como leis estaduais, acordo com associações de pescadores e surfistas, mas até hoje não se encontrou uma solução definitiva. A falta de uma legislação federal incidente sobre o tema é o grande paradigma desta problemática. A orla marítima é área de competência da União, cabendo a ela o ordenamento, gestão e fiscalização da orla e terrenos acrescidos (ORLA/MMA-SPU, 2006). Nesta interpretação, as legislações estaduais incidentes sobre a orla marítima perdem o sentido, fazendo com que as tentativas de ordenamento fiquem restritas a acordos entre as classes. Em alguns municípios temos exemplos de sucesso. Cassino (este no litoral Sul, considerado pela FGS como exemplo de área segura para prática do Surfe), Torres, Capão da Canoa - Xangrilá e Tramandaí – Imbé, onde acordos entre prefeituras e pescadores permitiram a criação de áreas de exclusão da pesca com rede durante o ano inteiro tornando estes municípios considerados seguros para a pratica de esportes náuticos. A idéia de criar áreas conurbadas de exclusão da pesca com redes entre estes municípios permitiu a fixação de áreas com extensão considerada segura para a prática de esportes náuticos em função de parâmetros de dinâmica costeira, como a corrente de deriva litorânea. Apesar destes exemplos, alguns municípios ainda são considerados como de alto risco para a prática de esportes náuticos. Seja por não possuírem áreas consideradas seguras para a prática de esportes náuticos, pela pequena extensão longitudinal das áreas existentes ou até mesmo pela falta de qualquer área destinada à prática de esportes náuticos. Além disso, o desrespeito às delimitações das áreas destinadas para cada atividade, por pescadores clandestinos e até mesmo legalizados que não aceitam a criação de zonas de exclusão da pesca, contribui para tornar esses locais como não adequados para a prática de esportes.
Dentre estes municípios abordaremos como estudo de caso o município de Cidreira, por dois fatores principais:
• Por ser o município que registrou o maior número de mortes de surfistas em redes de pesca desde 1983 até o presente;
• Por ser considerado pela Federação Gaúcha de Surf (FGS), como “área de mais alto risco para a prática de esportes náuticos dentre os municípios do litoral norte” (FGS, 2007).
Em análise realizada no município em outubro de 2007, pudemos presenciar algumas das alegações feitas pela FGS, como o desrespeito de ambas as partes ao acordo existente no município para usos da orla marítima. A foto dois ilustra essa alegação, onde surfistas “disputam” o mar com redes de pesca. Este flagrante foi captado a aproximadamente 600 metros ao sul da plataforma de pesca do município, ponto tradicional de prática de esportes náuticos, devido a melhor formação das ondas no local.
SURFISTAS A 300M SUL PLATAFORAM DE PESCA. CIDREIRA-RS.
Foto 2: Surfistas (canto superior esquerdo da foto) disputam área com redes de pesca. Cidreira, RS. 20/10/2007. Fonte: Ingo Kuerten.
Na próxima semana aqui no Top Wings o Capítulo 2 deste trabalho, ORDENAMENTO TERRITORIAL NA ZONA COSTEIRA, fique ligado.
Um comentário:
Ok Kolo, obrigado pelo comentário. Desejamos o mesmo para nossos hermanos Argentinos. Muita buena ola para todos! Abraço, Neko.
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