16 de abr. de 2009

O CASO PESCA E SURF (19)

Seguimos com O CASO PESCA E SURF, agora a postagem 19 no Top Wings. O intuito destas postagens é a de esclarecer surfistas e público em geral sobre um problema seríssimo que ocorre no litoral do Rio Grande do Sul. A prática de surf e de pesca simultâneamente tem causado mortes de seres humanos. Morte de surfistas. Simplesmente um absurdo. No sábado passado, 11 de abril, o surfista de 22 anos, Lucas Boeira Dias, morreu na praia de Capão da Canoa, preso a redes de pesca. Tragédia anunciada. É impossível que a comunidade em geral, surfistas, pais de surfistas, amigos, familiares, não se movimentem contra esta situação. É mais do que óbvio que se tudo continuar do jeito que está, em breve teremos notícias de mais mortes. Minha conclusão é simples. FIM DO SURF NO RIO GRANDE DO SUL. Se nada for feito para minimizar estes riscos, eu e minha filha, pelo menos nós dois, estaremos abandonando este litoral e procurando local seguro para prática do nosso surf. Neko.

9.2.1 Os Relatos dos Pescadores
Durante as entrevistas, quando questionados sobre o aumento da área destinada para surf, quatro pescadores aceitaram a possibilidade de se aumentar a área do município destinada para surf. Porém, um deles é pai de dois surfistas e os outros três são pescadores e também surfistas. Durante os levantamentos da ocupação e usos da orla tivemos a oportunidade de conversar com dois pescadores. Um deles, dono do penúltimo cabo de rede levantado no município, informou que é funcionário público aposentado e que pesca apenas como lazer. Afirmou também que tem duas filhas com terceiro grau completo, mora no município há dois anos e que não teve problemas em conseguir licença de pescador profissional artesanal. O outro pescador passeava pela praia de bicicleta e, curioso ao ver-nos tirando foto dos cabos de rede, veio conversar pra saber se éramos da prefeitura. Assim que soube que fazíamos um trabalho sobre pesca no município, fez diversas denúncias, inclusive citando nomes. Denunciou um colega que está morando em Tramandaí há dois anos, não vive mais de pesca, mas está tentando vender o ponto que lhe foi delimitado no município. Afirmou ainda que este mesmo pescador ainda recebe o defeso da piracema nos meses de verão. Falou que um cunhado seu, que é pedreiro e nunca pescou recebeu carteira de pescador da associação de pescadores do município apenas para ganhar o dinheiro do defeso em troca de votos nas eleições. Três pescadores que não puderam nos atender afirmando falta de tempo possuíam uma característica em comum: O alto poder aquisitivo. Chegamos à residência de um deles localizada próximo à plataforma de pesca, mas o pescador estava carregando seu Jipe para sair a pescar. A residência possuía três pavimentos além do térreo, contava com outros dois veículos na garagem e parecia ser bem grande. Em outra visita na tentativa de entrevistar o pescador, já percebemos o alto poder aquisitivo. Ele também possuía um Jipe, outros dois veículos, casa de alvenaria nova, muitas redes e petrechos de pesca em um galpão junto ao jardim em frente à residência. O terceiro pescador com alto poder aquisitivo foi onde fizemos nossa última parada para entrevistas. Ele é dono de uma peixaria na localidade de Nazaré, entre o centro de Cidreira e o balneário Salinas. Este pescador vive há mais de 25 anos no município de Cidreira, e é um dos responsáveis pela associação de pescadores do município. Apesar de alegar falta de tempo (atendia aos fregueses e também a um pescador que lhe trazia pescado) pudemos ter uma rápida conversa. Ao contrário da maioria dos pescadores entrevistados, este era muito articulado. Possui uma bela residência de alvenaria com dois pavimentos sobre sua peixaria, e no terreno ao lado havia dois caminhões, um Jipe e mais um veículo de passeio. Afirmou que têm um filho na faculdade, aparentando dominar os meios de comunicação como internet, etc. Assim que soube da aplicação dos questionários, contestou as afirmações dos pescadores antes entrevistados, alegando que nenhum deles ganha com a pesca menos do que R$ 1.500,00 por mês. Quando questionado sobre as áreas para surf e para pesca, afirmou que foi oferecido aos surfistas do município o aumento da área para surf em mais dois quilômetros para sul da atual área de surf, mas que estes não aceitaram porque “querem surfar na área central para poder aparecer”. O pescador que lhe fornecia os peixes não confirmou a alegação da remuneração média para os pescadores. Conversando com este pescador e observando seus atos e comportamento, pudemos ter uma visão um pouco diferente. Este pescador mora com sua esposa em uma vila de pescadores, sem luz elétrica, em uma localidade distante aproximadamente 60 km ao sul de Cidreira, conhecida como Farol da Solidão. Ele estava com sua esposa em um veículo Bugue entre caixas de isopor que estavam sendo preenchidas por cubos de gelo. Disse que trabalha em parceria com o outro pescador, e estava ali porque veio trazer pescado e buscar gelo para armazenar mais peixe. Rapidamente explicou-me como funciona essa “parceria” com o pescador dono da peixaria, que chamaremos de intermediário. Basicamente, ele entrega 40% do total de pescado como forma de pagamento do gelo e dos materiais de pesca (cabos e redes) que são alugados. O restante do pescado é vendido exclusivamente a este intermediário, com valor tabelado em função do quilo por tipo de peixe, sem possibilidade de negociação no preço. O pescador afirmou que vem ao município frequentemente entregar o pescado e buscar mais gelo. Antes de irmos embora este “pescador intermediário” afirmou que possui mais de 3.000 metros de rede pescando para ele no município. Isso caracteriza uma espécie de monopólio da pesca e dos pescadores.Considerando que uma rede de espera possui em média 150 metros de extensão, aproximadamente 20 redes/pescadores são explorados por este mesmo sistema de “parceria de pesca”. Um outro pescador, que vive no município há mais de 30 anos e é pai de dois surfistas fez outras denúncias e relatos. Afirmou que perdeu seu ponto de pesca durante a última divisão de áreas que ocorreu no município, pois estava indo “contra os interesses da associação” por defender o fim das redes de espera. Denunciou que um grupo de oito pescadores recebeu um bote através de projeto da EMATER/RS, mas que um dos pescadores do grupo não permitia seu uso, pois não se acertavam na forma como dividiriam os lucros desse tipo de pesca. Disse também que os outros pescadores do grupo temiam pescar com o bote por medo de se afogarem, visto a falta de conhecimento para este tipo de pescaria. Denunciou a venda de freezers para armazenamento de pescado, também recebidos via EMATER/RS. Questionado sobre os motivos pelos quais a produtividade da pesca tem diminuído tanto, este pescador afirmou que isso se deve pela pesca predatória que tem sido praticada no município com redes para captura de camarão. Para isso, mostrou-nos desenhos explicativos dessas redes, comparando a rede utilizada nas lagoas de Santa Catarina e a rede predatória que está sendo usada no município.
Seguem a seguir, nas Fotos 15 e 16.



Segundo o pescador, estas redes (predatórias) acumulam uma grande quantidade de pequenos peixes que ficam presos em seu fundo. A força da corrente de deriva litorânea acaba moendo os peixes e camarões, fato que tem contribuído para a diminuição dos estoques pesqueiros, segundo o pescador. Ele ainda afirmou que não consegue viver da pesca, e que seus filhos não conseguem trabalho porque o município fica abandonado no inverno, só tendo movimento durante o período de veraneio. Seus filhos vivem de colocar cabos de rede para os outros pescadores e da venda do crustáceo Callichirus Major, conhecido como “corrupto” (foto 17), que é vendido aos pescadores amadores na plataforma de pesca ao custo de R$ 1,00 (um real). Além destas denúncias e relatos, tivemos a oportunidade de fotografar alguns materiais de pesca (foto 18) e identificar cabos de rede que não podem ser visualizados por um surfista que eventualmente não consiga sair da água ainda dentro da área de surf (foto 19).




2 comentários:

Turtle disse...

ola neko,
mais uma vez me manifesto aqui, segue o link da ouvidoria do ministério publico do Rio Grande do Sul, http://www.mp.rs.gov.br/ouvidoria/formulario

quem sabe com algumas denuncias algo seja feito. pela promotoria publica.
boas ondas

Turtle.

abraço.

Neko disse...

Valeu Turtle, obrigado pelo interesse pelo assunto. Se todos nós surfistas nos uníssemos em torno do assunto, soluções certamente apareceriam. Todos querem surfar, poucos ajudar e ninguém quer morrer. Já existe um grupo estruturado para tocar este assunto perante os òrgãos públicos mas realmente mais gente tem que manifestar seu interesse em acabar definitivamente com este absurdo do século 21. Um abraço e boas ondas. Neko.