Nesta parte do trabalho O CASO PESCA E SURF, uma explanação dos métodos utilizados para os levantamentos de campo que trouxeram informações importantes e surpreendentes.
5 METODOLOGIA
Para entender como se dão os conflitos entre surfistas e pescadores no litoral norte do Rio Grande do Sul, partimos da idéia que eles são fruto de uma série de fatores distintos, balizados pelo uso e ocupação do solo na zona costeira. Por isso, entendemos que seja necessária uma visão holística sobre o ambiente costeiro para o entendimento dos problemas. Assim, buscamos estudar os conflitos em nível políticoinstitucional, legal, sócio-econômico e da dinâmica litorânea, partindo de uma escala de análise regional (Rio Grande do Sul, Litoral Norte) para depois focarmos nos problemas locais (Município de Cidreira).
Os procedimentos para estas análises foram os seguintes:
• Revisão bibliográfica conceitual, levantamento de dados secundários, legislação existente e busca por propostas metodológicas adequadas ao trabalho proposto;
• Coleta de dados em campo;
• Aplicação de questionários, entrevistas, levantamentos de dados qualitativos e quantitativos acerca do tema (estudo e compreensão dos conflitos);
• Análise em gabinete dos dados levantados, cruzamento dos dados e produção do mapa síntese do uso e ocupação atuais da orla;
• Discussão e apresentação da nova proposta de zoneamento;
5.1 Revisão Bibliográfica e Levantamento de Dados Secundários
A falta de estudos científicos que abordem os conflitos entre surfistas e pescadores constituiu-se no maior desafio para o desenvolvimento deste trabalho. Após algumas discussões com colegas que desenvolveram trabalhos na Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca – SEAP, do Governo Federal, pesquisadores do CECO/UFRGS, representantes da Federação Gaúcha de Surf – FGS e com pescadores e surfistas, foi traçada uma estratégia de pesquisa: Considerar os fatores morfodinâmicos responsáveis pela dinâmica Costeira (tipos de ondas, perfil de praia, corrente de deriva), as questões político/institucionais (programas de gerenciamento costeiro), legais (legislação incidente) e sócio-econômicas envolvidas nos conflitos. Para estas análises foi realizada uma revisão dos estudos já apresentados sobre a área – Litoral Norte e Orla Marítima de Cidreira – com base nas dinâmicas anteriormente citadas. Já no capítulo introdutório é feita uma discussão de termos e conceitos utilizados no decorrer deste trabalho, como as definições de Zona Costeira e de Orla Marítima, baseadas na conceituação do PNGC II (1998) e do Projeto Orla (2006), respectivamente. Além das definições conceituais, é feito um resgate da ocupação da zona costeira, partindo de uma tendência mais abrangente (ocupação da zona costeira brasileira) até chegarmos ao nível local (Litoral Norte e município de Cidreira). Apresentamos também alguns exemplos de impactos encontrados na zona costeira e na orla marítima em virtude dos processos de apropriação e uso do solo.
5.1.1 Nível Político-Institucional Para analisarmos os conflitos em nível político-institucional, fizemos um levantamento dos programas e projetos governamentais desenvolvidos para fins de gerenciamento costeiro e da orla marítima. Foram analisados o Programa Nacional de Gerenciamento Costeiro (PNGC) e seu resultante no estado do Rio Grande do sul (GERCO-RS) coordenado pela SEMA/FEPAM-RS e o Projeto Orla (ORLA - MMA/SPU, 2006). Também são utilizados estudos desenvolvidos pelos pesquisadores do Instituto de Geociências - UFRGS, Depto. De Oceanografia (FURG) além de órgãos auxiliares como o Instituto de Pesquisas Hidráulias IPH – UFRGS e o Instituto do Milênio – RECOSRS, melhor detalhados no capítulo 2 deste trabalho.
5.1.2 Análise da Legislação
Para uma análise sob o ponto de vista legal, foram pesquisadas na legislação federal, estadual e municipal as medidas já tomadas no sentido de disciplinar e gerir os usos da orla marítima. É discutido no capítulo 3, o Decreto Lei (DL) Federal de Incentivo a Pesca – DL 221/1967; e as leis e decretos estaduais: Lei 8.676/88, primeira tentativa de disciplinamento dos usos do mar no estado; Lei 11.886/03; Lei 12.050/03; DL 42.868/04; DL 43.375/04 e o DL 45.409/07 Em cima dessa legislação é feita uma discussão sobre as competências legais para gestão e fiscalização da orla marítima.
5.1.3 Ambiente Físico e a Dinâmica Litorânea
Para analisar o ambiente físico e a dinâmica litorânea da área de estudo, é feita uma compartimentação segundo o parâmetro avaliado. Em cada parâmetro são utilizados dados de trabalhos desenvolvidos na ou próximos à área de estudo. Assim, este capítulo (capítulo 6) foi dividido em estudos de Parâmetros Geomorfológicos, Variáveis Climáticas e Dinâmica Costeira.
• Parâmetros Geomorfológicos
Subdivididos em um detalhamento da planície costeira e do perfil praial do estado do Rio Grande do Sul, são apresentados a partir da revisão bibliográfica sobre os estudos de: Villwock et al (1984) e Villwock (1994), Wright & Short (1984), Toldo JR et al, (1993), Dillenburg (1996), Weschenfelder et al (1997), Villwock e Tomazelli (1995) e Hoeffel (1998).
• Variáveis Climáticas e Ventos
Estas variáveis são apresentadas com base nos parâmetros regionais, visto a falta de estudos sobre microclima e regime de ventos locais. Dessa forma, são considerados os tipos climáticos apontados por Köppen (1918), Geiger & Pohl (1953) sitados por Strahler (1978) e Strahler & Strahler (1994) e Nimer (1977). Não foram encontrados registros de medições do regime de ventos para o município de Cidreira. Utilizamos as medições descritas por Tomazelli (1995) e também uma caracterização microclimática mais específica do município de Imbé decrita por Nicolodi (1999), devido à proximidade com a área de estudo (aproximadamente 60km Norte) .
• A Dinâmica Costeira
Levantada através da caracterização da dinâmica proposta nos estudos de Alvarez et al (1981;1983), Villwock (1984), Wright & Short (1984), Toldo JR et al, 1993), Tomazelli (1993;1994), Villwock e Tomazelli (1995), Tozzi (1999), Gruber (2002), Nicolodi e Toldo JR. (2003).
5.1.4 Dados Tabulares e Cartográficos
O levantamento de dados secundários contemplou a busca por dados tabulares e cartográficos que permitissem analisar espacialmente a área de estudo. Utilizamos como base cartográfica para a pesquisa os mapas digitais de limites Federal, Estadual e Municipal, em formato shape produzidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Também foram utilizados o mapa de abrangência da área do programa GERCO-FEPAM e o mapa de Caracterização dos municípios do Litoral Norte de Fujimoto et al (2005). Dados sócio-econômicos foram pesquisados através do Censo 2000 – IBGE, Atlas Sócio-Econômico do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – ONU, Fundação de Economia e Estatística do estado do Rio Grande do Sul (FEE-RS) e dados compilados pela Fundação de Apoio aos Municípios do Rio Grande do Sul - FAMURS. Foi utilizado o mapa de arruamentos do município de Cidreira da empresa Digibase como referência para alguns levantamentos secundários, como identificação e localização de ruas sitadas nas leis municipais de delimitação da orla marítima de Cidreira, especificadas no capítulo referente à legislação.
5.2 Levantamento de Dados Primários
Foi levantado em campo, o uso e ocupação atuais da orla marítima do município, a quantidade e disposição dos cabos e redes de pesca, bem como a localização e extensão das áreas destinadas atualmente para esportes e para pesca no município. Este levantamento foi realizado com auxílio de GPS Garmin, com precisão de 4 metros. Para melhores detalhamentos foram feitos registros fotográficos da ocupação da orla, dos materiais de sinalização visual de delimitação de áreas, do material de pesca e demais cenários que fossem relevantes para esta pesquisa. A análise sócio-econômica se deu especificamente sobre o município de Cidreira, área definida nesta pesquisa como estudo de caso. Para isto, foram aplicados 2 tipos de questionários, destinados a pescadores e a surfistas, além de entrevistas com estes atores locais, além de veranistas (surfistas de fim-de-semana, não residentes) colhidas aleatoriamente, na beira da praia. Pretendíamos ter entrevistado algum representante do poder público municipal, porém não obtivemos resposta a nenhuma das diversas tentativas de contato que fizemos desde agosto de 2007. As entrevistas e questionários, além dos levantamentos de uso e ocupação atuais da orla marítima do município foram produzidos através de levantamento em campo durante os dias 20 e 21 de outubro de 2007.
5.3 Operacionalização dos Processos Metodológicos
5.3.1 As etapas de campo
Para o levantamento de dados em campo, foi utilizado um aparelho GPS Garmin, com precisão estática de 4 metros, máquina fotográfica digital e uma imagem de satélite captada na ferramenta Google Earth. Sobre esta imagem foi inserida a informação do limite municipal fornecido gratuitamente no endereço eletrônico do IBGE, através de técnicas de geoprocessamento com uso da ferramenta ARCGIS. A fotocópia desta figura foi fundamental para localização espacial em campo. O Google Earth é um programa com versão de livre acesso disponibilizada via web que contém a representação espacial do planeta terra através da mosaicagem de diversas imagens de satélite de alta resolução. As imagens contidas nesta ferramenta possuem localização espacial por coordenadas geográficas, Projeção e Sistema de Coordenadas conhecidos, configurando-se em ambiente georreferenciado.
5.3.1.1 Levantamento de Uso e Ocupação da Orla
Durante o dia 20 de outubro de 2007, os levantamentos tiveram como objetivo a observação do cenário onde se dão os conflitos. Foram levantadas a extensão atual das áreas delimitadas para lazer e pesca, localização espacial dos cabos e redes e diferenciação dos trechos da orla segundo a sua ocupação. A identificação dos diversos trechos, bem como dos cabos de redes e pontos de interesse foi registrado com GPS Garmin. Apesar de os pontos de controle terem sido captados de forma estática (operador parado), o receptor não indicou uma imprecisão (erro) menor do que 3 metros em alguns pontos. O erro máximo em captação de coordenadas de pontos de controle no terreno não ultrapassou também os 5 metros. Porém, como esta pesquisa não necessita de uma precisão submétrica para o tipo de levantamentos propostos, esta margem de imprecisão é aceitável. Salientamos que, no caso de um levantamento com fins de demarcação oficial de espaços, o tipo de levantamento de campo para captação de pontos e formulação de um mapa deve ser feito com aparelhos que ofereçam maior precisão, como GPS diferencial ou estações totais. Após a identificação em campo dos limites das áreas demarcadas para cada atividade, foi realizada a captação das coordenadas geográficas de cada ponto no receptor GPS. Uma prancheta de campo foi utilizada em auxílio aos levantamentos para registrar as diversas características levantadas em cada parada, tais como:
• Tipo de orla
• Presença do campo de dunas frontais
• Com ou sem ocupação humana
• Tipo predominante de ocupação (2ª residência, residências de ocupação permanente, sub-moradias). Durante o levantamento dos materiais de pesca e delimitação das áreas por usos no município, foram contempladas as variáveis:
• Presença de sinalização indicativa de áreas
• Tipo de sinalização (material, altura, tamanho)
Quanto aos materiais de pesca, foram levantadas:
• Presença de sinalização de material de pesca e identificação do pescador responsável
• Tipo de sinalização (altura, placa indicativa, etc).
Os registros fotográficos foram realizados com câmera digital Kodak com resolução de 3.2 megapixels. Foram fotografados os tipos de demarcações, materiais de pesca, exemplos de ocupação da orla e atividades de pesca e surf. Os pontos captados através do Aparelho GPS foram inseridos na ferramenta ARCGIS, sobre o mapa de limites municipais do IBGE. Através da criação de um banco de dados agregado foram inseridas as informações referentes ao tipo de orla em função da ocupação, ao número de cabos e redes, contabilizados em ordem crescente no sentido nordeste – sudoeste da orla municipal e ao tamanho da área destinada para surf e para pesca no município. A utilização da ferramenta Google Earth foi de vital importância para a classificação dos tipos de orla, pois através de suas imagens de alta resolução pudemos identificar o padrão das construções nos variados trechos da orla. Dessa forma foram gerados os mapas de uso e ocupação da orla marítima municipal, e o mapa com as delimitações da área de surf segundo as leis municipais 023/1989 e 1071/2002. Neste mesmo ambiente foi possível criar uma nova proposta de zoneamento da orla marítima municipal.
5.3.1.2 Aplicação de Questionários e Entrevistas
A produção de entrevistas e aplicação de questionários com pescadores e surfistas foi realizada durante o domingo, 21 de outubro de 2007. O roteiro deste segundo levantamento de campo consistiu na busca por pescadores e surfistas, na faixa de praia, que se dispusessem a falar sobre o tema e preencher os questionários. A entrevista com pescadores não buscou discutir o tema objeto desta pesquisa em si. Esta medida deu-se pelo fato de ser necessário discutir mais o modo de vida destes, para tentar entender a dinâmica da pesca no município, deixando para o final das entrevistas os questionamentos quanto aos usos e conflitos na orla. Foi utilizado um roteiro de entrevista desenvolvido em forma de questionário (apêndice 1). Através deste questionário pretende-se inferir:
a) Identificação e localização espacial destes pescadores: (Nome, endereço, etc.) e sua identidade com o município.
b) O(s) tipo(s) de pesca que pratica, a freqüência e se possui local fixo onde costuma pescar.
c) Se possui outra fonte de renda, qual o lucro médio mensal obtido com as atividades de pesca, o número de membros da família e;
d) Sua percepção quanto à delimitação por usos da orla marítima no município.
As perguntas contidas no questionário foram seguidas como roteiro de conversa e, após a entrevista, transcritas para análise. Foi aplicado um total de 9 (nove) questionários aos pescadores locais. O pequeno número de entrevistados deu-se pelo fato de que os pescadores preferem muito mais conversar a responder perguntas, sendo que cada conversa com estes pescadores durava pelo menos 30 minutos ao passo que os surfistas respondiam ao questionário mais rapidamente. Muitas vezes os pescadores respondiam verbalmente as perguntas e suas respostas eram transcritas pelo entrevistador, devido a sua dificuldade em escrever. Outras vezes a dificuldade consistia em responder aos questionamentos, sendo necessário explicar no que consistia cada pergunta. Os resultados das análises feitas através da aplicação dos questionários e dos levantamentos dos dados sócio-econômicos e sócio-demográficos serão agrupados em tabelas e representados em histogramas produzidos na ferramenta Microsoft Excel, e anexados ao capitulo referente à pesca. As entrevistas com surfistas, realizadas também no domingo, seguiram a mesma metodologia de abordagem aplicada aos pescadores, com aplicação de questionário específico (Apêndice 2) e algumas entrevistas gravadas com representantes da classe no município, transcritas posteriormente para análise dos dados. A escolha do domingo para entrevistar surfistas e pescadores partiu do pressuposto que este dia seria o mais propício da semana para aplicação dos questionários devido à maior procura do litoral por surfistas de final de semana. Além da entrevista com representante da Associação de Surf de Cidreira, a prospecção de surfistas para aplicação dos questionários se deu em dois pontos distintos da orla. O ponto mais ao centro junto à área demarcada para surf no município, conhecido como Calçadão de Cidreira e a Plataforma de Pesca de Salinas, localizada mais ao norte da orla do município. A escolha destes pontos se deu porque estes lugares são muito procurados por praticantes de esportes náuticos nos finais de semana, configurando-se em tradicionais pontos de encontro desta classe. Através dos dados obtidos com estas entrevistas e questionários, buscou-se inferir:
a) O grau de relacionamento e identificação dos surfistas com o município;
b) A freqüência com que visitam o município;
c) O gasto médio por pessoa para a visita e a utilização da infra-estrutura de serviços oferecida pelo município aos turistas;
d) As percepções acerca dos conflitos resultantes dos diferentes usos da orla marítima do município;
E a seguir, no Capítulo 6 do trabalho do Ingo, os conflitos LEGAIS entre a pesca e o surf no RS. Semana que vem tem mais!
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